Uma das mais carismáticas e conhecidas lideranças da esquerda paraense, Edmilson Rodrigues, causa polêmica na Assembleia Legislativa em seu terceiro mandato de deputado estadual. Prefeito de Belém por dois mandatos, com dezenas de prêmios e recorde de aprovação popular, em entrevista ao Blog da Leila Márcia, fala sobre a possível candidatura a prefeito de Belém no ano que vem.
Por Leila Márcia*
De forma otimista, Rodrigues analisa o governo Dilma, apesar das severas críticas a Lula, e diz que dificilmente Jatene [Simão Jatene (PSDB), atual governador do Pará] conseguirá se reeleger, pois não apresenta nada de novo para a sociedade paraense. Socialista convicto, reafirma seu compromisso de luta pela transformação social.
Blog da Leila Márcia: Você será candidato a prefeito de Belém?
Edmilson Rodrigues: Ser candidato a prefeito é uma possibilidade a ser considerada. Naturalmente, como militante do PSOL, um partido socialista, não posso colocar uma opinião pessoal acima da opinião do coletivo. O PSOL deverá fazer um debate democrático, nas esferas municipal e estadual, para ver qual o nome que mais agrega. Certamente este debate será feito levando em conta o conjunto das disputas municipais.
O meu nome é forte, não há dúvida disso. Fui deputado por duas vezes, prefeito da capital por duas vezes, com um alto índice de aprovação do nosso governo. Minha votação para este terceiro mandato me credencia a ser candidato.
No entanto, eu só aceitarei ser candidato, debater esta possibilidade, na medida em que seja uma estratégia coletiva do PSOL. A minha condição para ser candidato a prefeito é que a minha candidatura seja parte de um grande movimento cívico, que integre as pessoas honestas, de bem, que têm um projeto para o Brasil e para o Pará e pela importância de Belém no Brasil e na região amazônica, como uma das mais importantes metrópoles brasileiras, naturalmente Belém tem destaque neste projeto de nação soberana, democrática, mais igualitária, mais justa, mais feliz.
Blog da Leila Márcia: No caso da candidatura, não receia o poder econômico e o pouco tempo de televisão?
ER: O poder do povo, a vontade de mudança da população, dos movimentos sociais, dos lutadores e das lutadoras do povo, vão se sobrepor à força do dinheiro mais uma vez. Em 1996, poucos acreditavam na nossa vitória quando o PT era um partido de oposição e ainda muito fraco, tinha 2%, 3% nas pesquisas e os imbatíveis foram vencidos.
Mais uma vez esta possibilidade está posta. O PSOL é um partido forte a despeito de quem topa vir a ser candidato, temos grandes nomes. O tempo pequeno na televisão e o poder econômico sempre estiveram presentes na democracia de araque brasileira, mas não serão suficientes para apagar a chama que paira nos corações e mentes do nosso povo.
Blog da Leila Márcia: Qual a sua avaliação do governo Dilma e da aliança preferencial entre o PT e o PMDB? O PT ainda é um partido de esquerda?
ER: O PT ainda é um partido com matiz progressista. Em alguma medida posso dizer que é um partido de esquerda, mas não mais de uma esquerda radical. Cada vez mais o PT abandona um projeto de transformação estrutural da sociedade. Abandonou o sonho estratégico de uma sociedade socialista. No entanto, não pode ser enquadrado como um partido de direita.
Acontece que o governo Lula, mesmo que não possa ser igualado ao governo neoliberal de FHC, manteve uma política de aprofundamento da dependência do nosso país aos países do centro do imperialismo e dependência inclusive financeira, porque, apesar do discurso de independência em relação ao FMI, na verdade o Brasil seguiu a agenda pré-definida pelo Consenso de Washington, obedeceu à cartilha do Banco Mundial, do FMI, da OMC e, aliás, foi um aluno tão bem aplicado que até aumentou o superávit primário para poder manter esse projeto neoliberal de pagamento de uma dívida ilegítima, ilegal e impagável, a ponto de chegarmos hoje a mais de dois trilhões de dívida pública.Então naturalmente não havia necessidade de justificar a aliança preferencial com partidos conservadores e com história maculada pela corrupção, pelos desmandos e pela violência.
Não precisava o PT porque pra fazer um projeto que mantém a linha hegemônica da economia neoliberal, naturalmente que teria apoio para todas as reformas neste sentido, de aprofundamento do neoliberalismo. Essa aliança, em nenhum momento, serviu para aprovar reformas constitucionais que fossem à favor do povo, até porque é difícil ver na experiência do governo Lula programas estruturantes que possam ser considerados antineoliberais.
A reforma da previdência, a retirada de direitos dos trabalhadores e outras medidas nesse nível; a liberação para plantio de sementes transgênicas para favorecer um pequeno grupo de grandes empresas do setor, particularmente a Monsanto, e tantas outras coisas. Isso tudo já compunha a agenda neoliberal, de modo que não justifica em nome da governabilidade entregar o governo para uma política arcaica, corrupta, entre outras características.
A Dilma infelizmente mantém a mesma política e preocupa que ela tenha mantido a política econômica e do ponto de vista das poucas coisas progressistas do governo Lula, me refiro, por exemplo, à política de relações exteriores, ela tem sido regressiva, mas, o governo está aí iniciando e eu sou um militante de esquerda e por isso um otimista e esperaria mesmo ter a possibilidade de aplaudir o PT e Dilma caso ela viesse mesmo a implantar reformas estruturais que efetivamente diminuíssem as desigualdades sociais no país. A despeito da propaganda, o próprio IPEA, órgão do governo federal, acaba de lançar um estudo dizendo que as desigualdades não só permanecem, a distribuição de renda se deu mais nas classes média e baixa porque a concentração de renda aumentou, portanto um número pequeno de poderosas corporações ficou mais rica, os bancos, as mineradoras e as grandes empresas do petróleo estão aí para exemplificar e festejar suas grandes massas de lucro.
Então, a sorte, digamos, do governo Lula é que a conjuntura econômica mundial possibilitou um crescimento dos países subdesenvolvidos e apesar do Brasil ter um crescimento pouco significativo, se comparado com China, Índia e outros países em desenvolvimento. Mesmo Cuba, dentro de sua pobreza, chegou a crescer 13%, Venezuela em quatro anos chegou a crescer 17%, a Argentina tem crescido em média de 8% a 12% ao ano, e o Brasil com uma média abaixo de 5% conseguiu volumes de recursos que possibilitaram que a perda da renda da classe média não fosse tão sentida e com isso não houvesse um descontentamento, de modo que o grande beneficiário deste momento de crescimento, desta conjuntura favorável ao governo Lula foram as grandes corporações nacionais, especialmente as financeiras.
Blog da Leila Márcia: Qual o maior desafio que Belém precisa enfrentar na chegada de seus 400 anos?
ER: Nós fizemos um esforço de planejamento no orçamento participativo através do congresso da cidade e definimos 2016 como uma referência para a realização do Plano Belém 400 anos, ou seja, um conjunto de metas claramente definidas que atacam todos os problemas centrais de Belém, desde os problemas de infaestrutura e dentro disso os problemas de saneamento, que é muito grave, especialmente o tratamento da rede de esgoto que é praticamente 0% em Belém. O pouco que tem foi investimento do nosso governo, mas também o fornecimento de água potável, pois é um absurdo que ainda haja cerca de 160 mil belenenses, pelo menos, sem acesso à água potável.
Ao mesmo tempo a infraestrutura de pavimentação, algo que é muito importante, mas fundamentalmente aliar esse investimento aos investimentos sociais ampliando a rede hospitalar, mas também a rede básica, ampliando a rede de média complexidade, as policlínicas, as unidades mistas como antigamente eram chamadas, dando a elas condições de atender a demanda de urgência, encaminhando para os hospitais os problemas emergenciais.
O investimento em educação e política cultural, colocando num patamar socialista, digamos, com a democratização do acesso, a permanência e constituindo com o processo pedagógico arrojado da escola cubana uma educação com qualidade social, pois a educação não pode rimar com lucro, haja visto que é um bem social que tem um vínculo indissociável com a produção de um projeto soberano de país.
Belém é uma referência cultural para o Brasil e o mundo. Reconhecer a riqueza cultural e da cultura em geral, o modo de agir, de trabalhar, expressos na vida cotidiana do nosso povo, também dos nossos mestres do carimbó, de síria, do boi, do nosso teatro e outras manifestações artísticas, enfim construir e implantar este Plano Belém 400 anos será a grande meta.
É bem verdade que oito anos de destruição concentrada, com o apoio dos governos federal e estadual, pelo Duciomar, inclusive eliminando importantes instrumentos de políticas públicas, programas como a escola Circo, Sementes do Amanhã, fechando o Programa Família Saudável, fechando unidades básicas de saúde, enfim inviabilizando a qualidade social do serviço público, com um apoio financeiro enorme para fazer em véspera de eleição obras politiqueiras, mas apesar desses quase oito anos de destruição, ainda assim com o já estabelecido Plano Belém 400 anos, com vontade política e ampla participação da população de Belém, teremos motivos para festejar os 400 anos da nossa linda cidade.
Blog da Leila Márcia: Até agora o governo Jatene não disse a que veio. Você acha que ele tem fôlego para buscar a reeleição?
ER: Dificilmente conseguirá ser reeleito. Na sessão em que ele apresentou a mensagem na Assembleia Legislativa já ficou claro. Eu até tinha uma expectativa positiva devido ao clima de vitória eleitoral e a experiência que ele tem de quase 40 anos, apegado aos governos, desde os governos Sarney, passando pelo Jáder e Almir Gabriel , ele como governador de uma gestão anterior, de modo que a experiência, que a formação técnica propalada estão totalmente intervivos porque é um governo que não disse para o que veio até este momento e não tem razões para deixar o estado nesta situação de marasmo. Não há projeto definido em nenhuma área. Nem na área de saúde, educação, nem infraestrutura. É um governo que efetivamente terá que trabalhar redobradamente se começar agora já com atraso, se quiser sonhar com um próximo mandato.
Blog da Leila Márcia: Você se posiciona ideologicamente como socialista. O que significa hoje lutar pelo socialismo?
ER: O socialismo é uma declaração de amor à liberdade, à democracia, à justiça social. É a afirmação de um sonho de um mundo de homens e mulheres livremente associados como vários grandes pensadores se expressaram naquele que ficou conhecido como movimento dos socialistas utópicos, mas especialmente como afirmar amar, a possibilidade de construir o futuro e atrelá-lo ao presente. Marx já dizia que o capitalismo cria as condições objetivas e subjetivas para darmos um salto ao futuro, mas se ele previa isso no século 19, a revolução de 1917, liderada por Lênin, reafirmava a possibilidade da construção de um futuro justo, democrático e feliz.
Naturalmente que houve muitas contradições na revolução russa e na experiência soviética com um processo de burocratização, de cassação de liberdades, de violência, enfim a débâcle do regime, contudo a luta pelo socialismo permanece cada vez mais viva e não há possibilidade do futuro humano ser o futuro da barbárie. Só há um caminho para a humanidade que é a afirmação deste projeto socialista. Não há dúvida de que o futuro da humanidade será o comunismo.
O socialismo é, no entanto, a possibilidade de realizar uma verdadeira ebulição social, desde a base em cada território que constitui os países deste planeta, de modo a produzir a partir dos que vivem do trabalho uma verdadeira democracia, baseada nos interesses de todos, a cada um de acordo com suas necessidades, mas de cada um de acordo com suas possibilidades, pois é exatamente o respeito às diferenças que afirma o direito á igualdade, o verdadeiro princípio da democracia e é também a construção desde a base, da maioria do povo, daqueles que vivem do trabalho que permite afirmar que a democracia é a vontade da maioria.
Hoje a democracia que nos oferecem, em grande medida conquistada na luta contra a ditadura, é uma democracia totalmente influenciada pelo poder de compra de votos, pelo poder econômico das empresas, de modo que senadores, deputados, prefeitos, governadores como regra geral são meros serviçais do poder econômico.
O socialismo não é só um sonho, é uma possibilidade. Como nunca, o mundo na globalização atual apresenta as condições técnicas e filosóficas para dar uma grande guinada histórica. Este processo de mutação econômica e técnica ainda está ocorrendo, mas já avançamos muito. Cada vez mais a violência contra a mulher e a criança, o preconceito contra o homossexual, o racismo e outras formas de opressão sofrem o repúdio das massas populares, de modo que isso é uma expressão concreta de valores novos que embrionam a cultura, enfim os novos valores, os novos valores socialistas, embrionam porque são processos constituintes do presente.
Naturalmente que a técnica hoje é apropriada pela burguesia com o objetivo único de alcançar lucro. É usada na concentração de riquezas de uma minoria. Por exemplo, a técnica informacional que permite com que as bolsas de valores girem nos países todos, transformados em verdadeiro cassino, no início de uma crise estes mesmos agentes econômicos conseguem utilizar esta mesma técnica para viabilizar os seus lucros e superar a crise, a ponto de um cineasta como o Michael Moore, que é norte-americano, dissidente da política oficial, denunciar que apenas 400 norte-americanos, todos eles recentemente beneficiados pela política de incentivo do governo Bush, mas também do Obama, com a desculpa de superação da crise, investimentos bilionários da riqueza norte americana, em grande medida explicada pela exploração de países como o socialismo dará passos largos no rumo do futuro de homens e mulheres livremente associados, enfim à utopia socialista. Cerca de 400 empresas detêm tanta riqueza quanto mais da metade do povo norte-americano, então essa concentração de riquezas se explica pelo uso da técnica em favor do lucro. Naturalmente quando o povo se apropriar da técnica de forma hegemônica da técnica o socialismo dará passos largos sem direção ao futuro, homens e mulheres livremente associados, ou seja, a utopia comunista.
* Leila Márcia é presidente do PCdoB-Belém e membro do Comitê Central do PCdoB.
Com a experiência e este discurso com certeza chegaremos onde queremos. O Tempo e sua relatividade nos conduzirão até lá...
ResponderExcluir